segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Por um triz...

De repente, o branco-gelo frio do chão da cozinha foi substituído pelo vermelho-sangue quente da cabeça. Pude ver meu pai morrer...

... e ressuscitar...

Por alguns instantes nossos olhares ficaram equalizados em uma frequência que só nós dois pudemos conhecer: seus olhos estatelados se moveram em direção aos meus olhos, já estatelados... enquanto eu temia que a minha fotografia daquele momento de apreensão seria a última imagem que meu pai veria antes de partir, para sempre.

No hospital eu e ele passamos algum tempo conversando sobre a nossa impotência diante de alguns acontecimentos: como é desconfortável ver uma pessoa sadia ficar doente; a angústia trazida pela obrigação de aceitar o fato de não se ter o controle sobre aquilo que não pode ser controlado...

Meu pai dormiu em companhia de minha mãe. Eu fui para casa. Telefonei para o meu namorado e pedi para ele cuidar de si com carinho... (quando sou surpreendida por algum acontecimento grave e triste, fico apreensiva e passo a temer que o mal se alastre para a vida de todos os entes queridos).

Depois de uma noite especialmente não dormida, no sábado pela manhã voltei à cozinha e tentei imaginar um travesseiro grande e macio, capaz de amortecer a queda: tentativa de inventar uma versão mais confortável de uma cena que ainda me angustia, fragiliza e ecoa constantemente em minha memória.

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