quinta-feira, 18 de junho de 2009

Rio, 40 graus

Nelson Pereira dos Santos dirigiu em 1956 o filme "Rio, 40 graus". O filme possui uma proposta independente, buscando tratar de uma temática brasileira, mas não da maneira que os projetos da Vera Cruz se pautavam, com altos orçamentos e uma temática que não fosse exclusivamente brasileira, mas sim exibir\discutir alguns dos problemas sociais brasileiros, com um orçamento adequado ao mercado de distribuição ao qual seria inserido.

O filme se inicia com seis jovens da favela do Cabuçu organizando uma saída para trabalhar com vendas de amendoim torrado. O objetivo, além do sustento deles, é ganhar dinheiro para a compra de uma bola de futebol. Eles se dividem em diversas partes da cidade onde a classe média e média-alta se situam, para tentar melhores chances de sucesso nas vendas. Nisto as estórias se separam, mostrando diversos tipos sociais, tais como políticos, malandros, exploradores de trabalho infantil, estrangeiros, militares de baixa patente, migrantes, "alpinistas sociais", pessoas do mundo do futebol, elites sociais da zona sul do Rio, dentre outros. Grande parte da "independência" do filme é mostrar as inter-relações desses tipos sociais e tentar elucidar alguns dos porquês da manutenção das diferenças sociais entre eles. Os personagens do "núcleo Cabuçu" constituem o amálgama das diversas estórias apresentadas, no sentido de que o contexto de sua busca por dinheiro apresenta suas relações com as diversas partes da cidade do Rio de Janeiro, e também com os que ali estão, permitindo o desenvolvimento de estórias secundárias, para ser possível um panorama sobre a sociedade desta cidade.

Em aspectos de estilo, o filme faz bom uso da linguagem cinematográfica, mas sem preciosismos como uso excessivo de travelings e panorâmicas. Na narrativa há pouco uso de planos-detalhe, mesmo em diálogos, visando maior praticidade nas gravações. Num todo, há uma tendência de uso de planos estáticos, mesmo evitando uso de zoom-in\out. A maioria das cenas é gravada em externa diurna, com predominante (quase exclusivo) uso de locações. A utilização de montagem paralela é o que garante grande parte do sucesso da trama, pois permite que várias estórias sejam contadas ao mesmo tempo. Além disso a trama estabelece uma elipse, pois o filme começa com a diáspora na favela, e encerra com o retorno dos garotos à mesma, passando claramente uma sensação de cotidiano e de continuidade das situações. O uso de trilha sonora na construção dramática é, de certa maneira, pouco utilizado (se comparado aos filmes da Vera Cruz), mas possui destaque em alguns momentos, tal como na abertura do filme e na seqüência final, com o encontro das escolas de samba. Na abertura do filme também se destaca o traveling de helicóptero, que mesmo com a trepidação da câmera, cumpre bem a função de mostrar um plano geral das locações da estória, aumentando a coesão da mesma, e realçando a beleza geral da cidade.

Em suma, é possível afirmar que Nelson Pereira dos Santos conseguiu montar uma estória ficcional com grande apoio na realidade, mas não só para buscar verossimilhança e\ou as belezas do Brasil, mas sim para evidenciar, de maneira acessível e pouco enfadonha os problemas da cidade do Rio de Janeiro.

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