sábado, 13 de junho de 2009

Onde está o seu lar?

A tartaruga tem sua casa própria: seu próprio casco.

Por analogia, eu também teria minha casa própria, inseparável de mim: meu corpo, minha mente, minha alma... (repletos de vontades, sonhos e sentimentos).

Essa percepção tornou-se um tanto mais evidente hoje à tarde: em meio ao tumulto causado pela a multidão que descia do ônibus, um cara, involuntariamente, pisou no meu pé e acabou por debilitar ainda mais o meu dedão esquerdo que já se encontrava machucado. Naquele momento, senti-me agredida e uma dor aguda arrancou minhas lágrimas. Pareceu-me que o chão da minha casa havia sucumbido assim como os telhados das casas dos Três Porquinhos sucumbem diante da ação do Lobo-Mau. Por alguns instantes senti-me desabrigada...

Há algum tempo tenho refletido o que é ter um lar, se eu o tenho e, se sim, onde ele estaria localizado – perguntas e respostas difíceis.

A relação entre o lar e o seu morador funciona apenas quando ela possui traços marcantes de reciprocidade: por um lado, cabe ao lar oferecer abrigo, proteção, segurança, acolhimento, aconchego, liberdade e conforto ao seu morador. Por outro lado, espera-se que o morador perceba essas vocações e se sinta abrigado, protegido, seguro, acolhido, aconchegado, liberto, confortável e, o mais importante, identificado com seu lar. Se isso não acontecer plenamente, existe habitação, não lar.

Viajando de Campinas para Nova Odessa, as minhas reflexões ainda permaneceram ao longo de todo o trajeto, tornando-se mais aguçados pela noite fria e chuvosa – contexto propício a conduzir-me a querer chegar logo em casa, para tomar um banho, me aquecer e tomar uma xícara de chocolate quente, pois cappucino costuma causar-me insônia.

Viajei sentada ao fundo do ônibus, em frente à porta de saída. Comecei a perceber que o lar não está obrigatoriamente associado à edificação: à minha direita, alguns bancos mais à frente, uma jovem mãe abrigava em seu colo a sua criança, dando a ela amor, carinho e aconchego. Por meio desses gestos, o menininho encontrou o seu lar no corpo de sua mãe.

Três bancos a minha frente, um casal de namorados viajou abraçado, trocando beijos e carinhos ao longo de todo o percurso. Olhavam-se nos olhos e pareciam reciprocamente aconchegados. Tive vontade de tirar uma foto dessa cena – minha câmera estava na minha bolsa, mas não fui suficientemente audaciosa para alcançá-la e disparar um click, mesmo que o fizesse sem que o casal percebesse a minha ação. Essa cena lembrou-me de minhas segundas-feiras, quando eu e o Ri viajamos de Jundiaí a Campinas, e de nossos finais de semana passados juntos. Pode ser que seja em companhia dele que encontro um dos meus possíveis lares: o Ri me abriga, protege, acolhe, aconchega e conforta através de seu olhar único – ele possui a coloração mais surpreendente –, de seu amor, de sua predisposição ao diálogo, de sua iniciativa em me aconchegar junto ao seu peito... (- Vieni qua, amore mio!)

A verdade é que eu não possuo um único lar e, é por isso, que necessito descobrir onde estão localizados os meus outros lares possíveis. Desta forma, passo agora a me perguntar: ONDE “eu gosto de saborear um bom vinho tinto ou um cappucino?”; “gostaria de estar quando eu me sentir triste ou alegre?”; “choro desmedidamente?”; “encontro a minha família?”; “gosto de estudar italiano?”; “sinto-me à vontade para reunir meus amigos?”; “tomo banho despreocupadamente?”; “sento-me para ler ou escrever?”; “guardo meus objetos pessoais?”; “uso o telefone com privacidade?”; “tenho a chave da porta?”; “está localizada a minha cama?”; “sinto-me inspirada a fazer bolo de maçã com canela?”; “posso ficar de camisola?”; “deito e coloco os pés no sofá?”; “posso sair de toalha do banho?”...

Infinitos questionamentos como esses, se respondidos em conjunto poderiam, talvez, remeter-me ao meu lar. Talvez o local que acomodasse a maioria das respostas às questões poderia ser o meu lar. Onde está o meu lar? Tenho fragmentos espalhados de lar que, se pudessem ser ajuntados, provavelmente, não formariam um lar completo. Mas será que cada fragmento desses, por si só, já não seria uma parte completa do lar?

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